sexta-feira, 5 de outubro de 2012

007 - Quem nós não somos

Quem nós não somos?

Enquanto nós possuirmos um corpo com algum estado de saúde, nós teremos pensamentos, e nós continuaremos a pensar de uma maneira dualística. Não há como pensar de outra forma. Bom/Ruim, Feliz/Triste, Passado/Futuro, Prazeroso/Não-Prazeroso, e assim por diante. Mas quando você começa a se dar conta deste processo dual de pensamento, você passa a não se sentir mais limitado por ele. Os pensamentos vêm e vão e nós devemos estar presentes e lúcidos no aqui e agora, transcendendo mais do que se condicionando com este banco de memórias mental/emocional.

Ahamkara é uma palavra em Sânscrito para designar apego a uma idéia ou emoção. Literalmente ele significa a expressão "Eu sou isso" ou "Eu sou aquilo". Ainda que estes pensamentos-declarações sejam verdadeiros em um nível relativo, nenhum deles se relaciona com a sua natureza essencial.

Enquanto nós mantivermos a identificação desta forma, acreditando sermos nós o conjunto corpo/mente, este ego ficcional estará atuante. Por isso, os professores de Advaita modernos frequentemente dizem que o buscador jamais encontrará a verdade ou a realização pois o buscador é aquilo que é buscado.

O Advaita tradicional não diferencia as emoções dos pensamentos e percepções. Tudo surge da mente (manas) e então a identificação com os pensamentos e percepções assumem o controle. A cognição é o modo básico da mente. Todas as suas várias funções como pensar, sentir, imaginar, recordar e o próprio ego – são iluminados pela luz desta Consciência, que é a essência do Self e a única realidade. Portanto, todos estes estados são apenas objetos da Consciência.

Se nós permanecermos apegados a um estado emocional ou a uma idéia fixa, ele ficará conosco o tempo todo. A partir de um certo momento, acreditaremos que nós somos o que nós pensamos e o que nós sentimos, o que não tem nada a ver com nossa verdadeira natureza. A metáfora de um ator encenando em um palco é um lembrete útil de que jamais devemos identificar o nosso Ser com os papéis que estamos executando no palco da vida. É difícil remover o ego deste processo. Quando adquirimos entendimento nós começamos a diminuir o ego. Mas os professores de Advaita nos relembram de que para eliminar o ego não devemos usar a nossa intenção para eliminá-lo. Quanto mais crédito você der ao ego tanto mais ele cresce. Shri Atmananda explica-nos que remover o ego é como tentar trazer luz para dentro de um cômodo tentando remover a escuridão. Você nunca terá sucesso. Portanto, simplesmente ignore o ego e tente entender e o entendimento por si só removerá o ego.

Enquanto permanecermos identificados com a mente e os seus pensamentos e emoções estaremos fadados a sofrer as consequências desta visão distorcida da realidade. Möller de la Rouviére nos lembra que "através do processo de identificarmo-nos com as atividades do pensamento, ele não mais servirá à vida humana, mas se tornará ela própria. A identificação com o pensamento significa que nenhuma separação existe entre a mente humana (como pensamento) e a vida humana. Nós devemos abrir mão dos pensamentos e emoções, reconhecendo que eles são tão somente aparições dentro da Consciência e que tão rápido quanto apareceram também irão desaparecer".

Do que eu entendo do que foi exposto acima, não temos como parar de pensar e sentir, o que é impossível, mas podemos reconhecer que nós não somos os nossos pensamentos e emoções e deixá-los partir. Entretanto, a maior parte das pessoas acredita que são o complexo corpo/mente. Nós abraçamos este conceito com tanto ardor em nossa sociedade que nos referimos a "superachievers" e vencedores quando as pessoas pensam e fazem mais do que acreditamos que elas sejam capazes (ou que nós sejamos) e nos referimos a "underachievers" ou perdedores quando elas fazem ou pensam menos do que nós pensamos que elas sejam capazes (ou que nós sejamos). Tudo porque opinamos e agregamos valor ao que nós não somos em realidade – carreira, nacionalidade, religião, histórico acadêmico, etc – aprendendo a agregar valor à vida humana como fariámos a um objeto. Em nossas vidas tivemos sempre a oportunidade de encontrar pessoas de todas as origens, capazes de profundas introspecções sobre a realidade porque estas pessoas utilizam uma faculdade mais refinada da mente denominada em Sânscrito buddhi ("intelecto"), que é sinônimo de uma capacidade de discernir e reconhecer o falso do verdadeiro, o real do irreal, pessoas que nos lêem como um livro aberto e que raramente recebem de nós qualquer validação ou reconhecimento.

Há muito ainda para ler e muito estou me esforçando para entender Advaita, algo tão novo para mim, tão antigo para a humanidade e tão fascinante. Até a próxima !

Martius de Oliveira

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